O relatório Year in Swipe 2022 do Tinder indicou que os jovens solteiros já estavam falando sobre "situationships", uma conexão casual consensual com status de relacionamento válido. Um ano depois, o dicionário Oxford foi o responsável por enfatizar mais uma vez que esse arranjo está mais na moda do que nunca, lembrando que o termo foi o segundo que melhor captou as tendências de 2023.
Definição e características
— O termo mescla as palavras relacionamento e situação, por isso, pode ser traduzido como "estar em uma situação". É uma forma de relacionamento em que algo existe, mas, ao mesmo tempo, nada existe. Existe sexo, mas não um relacionamento. Nós nos encontramos, mas não é um encontro. Uma situação é um sim e um não — tenta definir Eva Gutiérrez, autora do livro “Si es toxico no és amor” (“Se é tóxico não é amor”).
Os inimigos da ambiguidade também ficarão decepcionados porque, como se vê, é um anglicismo pouco conclusivo, parece destinado ao “se” e ao “talvez”.
— Nesse tipo de relacionamento não há espaço para rótulos como casal ou namoro, porque não há compromisso. São relações baseadas no imediatismo, o mesmo que vivemos em nossa sociedade. Não esqueçamos que estamos na era de ter o que queremos aqui e agora. Vivemos segundo a segundo: se não gosto, jogo fora com um único clique. Perdemos a paciência. Por que a nossa forma de nos relacionar seria diferente? — questiona.
O Tinder viu um aumento de 49% no número de membros que adicionaram essa nova intenção de relacionamento aos seus perfis, e mais de um em cada dez jovens solteiros entrevistados disseram preferir situationships como forma de ter um relacionamento com menos pressão.
A adoção desse tipo de relação foi eternizada em 2009 nas telonas, em “(500) dias com ela”. Os protagonistas do filme mantêm um não relacionamento em que ele deseja uma parceira estável enquanto ela sempre deixa claro que prefere um companheiro que hoje se enquadraria perfeitamente na definição de situationship. Porém, naquela época não existia um termo que definisse esse tipo de relacionamento.
Há uma cena do filme que ilustra muito bem o tema. No carro, a caminho do cinema, o personagem faz uma daquelas perguntas assustadoras: “O que somos?”. Ela responde com um indescritível “o que isso importa?”, e então faz cócegas nele e ri, criando um espaço de intimidade no qual ele se sente seguro, mesmo que a resposta não tenha sido a que esperava.
Na verdade, mais tarde seus amigos tentam forçá-lo a perguntar diretamente à garota se eles estão namorando (que é o que ele anseia), mas ele diz que eles não acreditam em rótulos. Esse momento é o que melhor esclarece que a razão pela qual ele não quer levantar tal questão é que sabe perfeitamente que a resposta dela significaria o fim da situationship.
— É fundamental saber se vocês dois estão perseguindo o mesmo objetivo, porque se uma das partes se apaixona e quer algo mais e a outra não, é hora de parar e se perguntar se esse tipo de relacionamento vale a pena para você — afirma Gutierrez. — Para mim, o mais importante em qualquer tipo de relacionamento é se perguntar como você se sente. Isso faz você se sentir bem, à vontade? Ou, pelo contrário, inquieto, preocupado, invisível, inseguro…
Mas será que esse tipo de relacionamento é realmente uma desculpa para fugir do compromisso? Eva Gutiérrez explica que justamente o que define esses casais é a falta de compromisso, porque, diferentemente dos modelos tradicionais, as situações não são formais nem têm título oficial.
— O denominador comum é a falta de rótulos claros e de compromisso. Não há uma definição clara do relacionamento, então você pode não saber se a outra pessoa está conhecendo mais pessoas ou se ela só liga para você em horários específicos, como quando está entediado em casa, por exemplo — diz.
Já Flavia dos Santos, sexóloga que colabora com a plataforma de encontros extraconjugais Gleeden, não acredita necessariamente que esse tipo de relacionamento seja uma forma de evitar compromissos.
— Mesmo em situationships é preciso ter compromisso. É preciso marcar um horário, escolher um lugar para se encontrar, estar disponível... Significa não se rotular em uma única forma de vivenciar os encontros amorosos — defende.
Vantagens e como identificar
Ao avaliar os pontos positivos desse tipo de relacionamento, é comum que surja a figura do companheiro de sexo, algo que Flavia considera menos positiva.
— A situationship é melhor do que isso, porque dá a oportunidade de encontrar coisas em comum com o outro, de compartilhar momentos que podem ser enriquecedores para ambas as partes. Embora possa parecer muito superficial, acho que pode ser a ponte para um relacionamento estável. Quando você tem um companheiro sexo, não há nada além de sexo — explica.
A psicóloga e sexóloga Ana Lombardía considera que esse tipo de relação pode ser útil e interessante para um momento, quando, por exemplo, o casal acabou de se conhecer e está testando a compatibilidade.
— Assim, permite que as pessoas não se apressem a entrar numa relação que pode não servir ou para a qual não estão preparadas. É importante que esta situação não perdure muito no tempo, ou que uma situationship não emende na outra eternamente, mas que seja o passo natural do processo de conhecer alguém — alerta.
Os especialistas em namoro do aplicativo AdoptaUnTío, no qual o uso do termo situationship disparou no verão passado até chegar a 15% das autodefinições, prepararam uma descrição de quatro sinais que permitem identificar se você também está em uma relação assim.
“Os envolvidos podem se tornar exclusivos, mas não costumam pensar em um futuro juntos. É antes um sistema sem obrigações de casal”, explicam.
“As situações são bastante casuais e você tem que deixar as coisas fluírem. Se as duas partes planejam fazer algo, esse plano não irá além dos próximos dias ou semanas. A situação é tão efêmera que seria arriscado comprar ingressos para um festival com seis meses de antecedência”, afirmam.
“As pessoas que vivem a situationship concordam que apresentar o parceiro aos amigos não é o melhor caminho. Levar para conhecer seu círculo social implicaria definir a outra pessoa como amigo ou namorado”, alertam.
“É verdade que os casais que estão neste tipo de relacionamento se encontram e fazem planos, mas não como encontros românticos. O objetivo é mais se encontrar para assistir a um filme no sofá ou algo assim. A regularidade desses encontros não é especificada por eles”, indicam.
Por fim, devemos lembrar a importância de não ignorar a responsabilidade emocional, o que significa reconhecer e assumir que as nossas ações provocam reverberações afetivas nas pessoas com quem interagimos.
— Devemos estar conscientes das implicações que advêm dos vínculos que estabelecemos com outras pessoas. A pergunta de um milhão de dólares é qual é o seu objetivo em um relacionamento sem rótulos e se ele é igual ao da outra pessoa. Se vocês têm objetivos diferentes, as coisas podem ficar muito complicadas — defende Eva Gutiérrez.
Ana Lombardía faz um importante esclarecimento como consideração final:
— Devemos lembrar também que o fato de gostarmos de alguém, mesmo quando há amor, não significa que devamos ou possamos estar com essa pessoa. Gostar de alguém é a base, algo que deve ser dado como certo, mas tudo o mais que construirmos será essencial. Amor e atração não são suficientes.
É por isso que Summer, do filme, não era uma mulher malvada nem um robô (como comenta o protagonista em uma cena). Quem não quer um relacionamento tradicional não deve ser apontado como cruel, desde que tenha comunicado à outra pessoa o que quer e busca.
Fonte:https://oglobo.globo.com/saude/bem-estar/noticia/2024/02/05/nem-namoro-nem-contatinho-saiba-o-que-e-a-situationship-e-descubra-se-voce-vive-uma.ghtml
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