NAMORO APÓS OS 60 ANOS: 'É REAL, NÃO PRECISO MAIS CONTAR HISTÓRIAS QUE NÃO SEJAM VERDADEIRAS SOBRE MIM'
Namoro após os 60 anos: ‘É real, não preciso mais contar histórias que não sejam verdadeiras sobre mim’
Um novo romance pode ser infinitamente melhor depois de décadas de experiência de vida
Por
Catherine Pearson
Em The New York Times
10/11/2023 04h01 Atualizado há 2 dias
Quando Janet Ha, de 65 anos, tentou o namoro online pela primeira vez em fevereiro deste ano, ela achou “estranho e confuso”. O ex de seu filho, de 20 e poucos anos, ajudou-a a criar um perfil no Bumble, mas todas as suas partidas iniciais se concentraram em ficar juntos.
— (No aplicativo,) Eu marquei 'algo casual' porque não achei que estivesse procurando um relacionamento, mas não percebi o que isso significava no Bumble — conta Ha, rindo.
Ela aprendeu rapidamente a navegar no aplicativo, mas ainda não tinha certeza do que queria. Seu casamento de quase 30 anos terminou em divórcio e seus filhos já eram adultos.
— Eu simplesmente não queria mais ter que cuidar de ninguém — constata a mulher, que é professora de Minnesota e planeja se aposentar na primavera de 2024.
Nos Estados Unidos, o namoro entre americanos mais velhos está em destaque graças à estreia do reality show “The Golden Bachelor”, que segue Gerry Turner, um viúvo de 72 anos, em sua busca para encontrar uma parceira. O programa é um spin-off de “The Bachelor”, com solteiros de 60 anos ou mais.
O movimento também é semelhante no Brasil, e cada vez mais idosos estão buscando sites e aplicativos de relacionamento. O Coroa Metade, voltado especificamente para pessoas mais velhas, conta com cerca de 800 mil usuários cadastrados e mais de 250 mil ativos e, em dez anos, foi o ponto de partida para mais de cem casamentos. No Inner Circle, outra plataforma para quem quer encontrar um par, cerca de 6 mil pessoas a partir dos 60 anos estão online. Já no Happn, usuários dessa faixa etária trocaram mais de 4 milhões de likes só neste ano no Brasil.
Embora seja improvável que os reality shows reflitam as experiências típicas de pessoas solteiras mais velhas, milhões delas procuram o amor — e suas histórias são frequentemente esquecidas. Os namorados mais velhos enfrentam todos os desafios que seus colegas mais jovens enfrentam, como burnout, ghosting e gaslighting, mas muitos deles descobriram que namorar pode ser infinitamente melhor quando você não tem muito a provar.
A narrativa predominante em torno do número crescente de idosos solteiros tende a se concentrar nos riscos do isolamento e da solidão. Mas Sindy Oh, psicóloga clínica licenciada em Los Angeles, disse que ficou impressionada com o quão diferente o namoro pode ser para seus clientes mais velhos, porque eles têm um senso de identidade muito mais forte.
— Eles aceitaram quem são e estão se apresentando como são — diz ela.
‘Sexo incrível’
Embora a introdução de Ha ao namoro online não tenha ocorrido da melhor forma, há quatro meses ela “deu match” com Mike Ecker, um eletricista divorciado de 64 anos. Ela analisa como seria sua experiência com o pretendente se tivessem se conhecido quando tinham 20 anos.
— Não acho que teria me sentido atraída por ele, e não acho que ele teria se sentido atraído por mim — pondera, descrevendo-se como uma “garota da cidade” e o Sr. Ecker como um “cara do interior”.
No entanto, o relacionamento deles se formou de maneira fácil e instantânea. Sempre que a Sra. Ha combinava com alguém, ela perguntava qual música a pessoa estava “curtindo”. Ecker, então, enviou “Invisible”, de Trey Anastasio. Parecia um sinal, já que a mulher vinha pensando muito sobre a invisibilidade das mulheres mais velhas .
No terceiro encontro, a Sra. Ha dirigiu três horas de sua casa até o local onde o homem morava para que pudessem passar o fim de semana juntos. Eles passaram quase todos os fins de semana juntos desde então, jogando dados e cartas, cozinhando e fazendo o que Ha descreveu como sexo “alucinante” — o segredo, disse ela, é uma boa comunicação.
— Estamos realmente abertos para conversar sobre tudo de uma forma que nunca experimentei antes — comenta Ha. — Eu tinha medo de mostrar quem eu realmente era em um relacionamento antes porque eles poderiam ir embora. E eu não tenho mais isso — conclui.
'Tiro de um canhão'
Um em cada três baby boomers (quem nasceu entre 1945 e 1960) é solteiro, como afirma Susan Brown, ilustre professora de sociologia da Bowling Green State University que estuda as mudanças demográficas no casamento e no divórcio. Ela estima que 14% das pessoas solteiras com idades entre 57 e 85 anos estão em algum tipo de relacionamento.
David, de 61 anos, descreveu a sensação de ter levado “um tiro de canhão” quando começou a namorar, depois que seu casamento de 25 anos terminou em divórcio. Ele disse que achou “a solidão de um casamento frio ainda mais solitária do que estar sozinho” e agora está experimentando o poliamor e a não-monogamia. Ele teve “pressentimentos dessas coisas” durante seu casamento em grande parte assexuado, mas nunca sentiu que pudesse explorar esses lados de si mesmo. O homem ainda descreveu a confiança que sente agora como “uma característica notável do namoro de meia-idade”. (David pediu que apenas seu primeiro nome fosse usado em respeito à privacidade de sua ex-esposa).
— Uma coisa que descobri rapidamente é: 'Uau, você realmente não precisa jogar nenhum jogo neste momento da vida', analisa David, que mora na Califórnia (EUA). — Não preciso contar nenhuma história que não seja verdadeira sobre mim. E elas também não — acrescenta.
Kathy Denton, de 64 anos, disse que se sente “mais ousada” agora, em parte porque não sente mais a pressão que sentia antes para se acalmar. Ela conseguiu se divertir com alguns dos homens que conheceu por meio de sites de namoro, mesmo que nenhum deles fosse um par de longa data. Um “homem encantador” preparou para ela “as melhores sopas e cafés da manhã”, enquanto outro a levou para seu condomínio na Flórida (EUA) e mostrou-lhe “como se divertir novamente”.
Denton gostaria de se apaixonar novamente, mas também “se apaixonou” por si mesma, como ela afirma, e percebe que é a única companhia de que precisa. Ela vai à praia, passa o tempo com os amigos e planeja se matricular em um curso de vitral.
— Se eu tivesse que passar o resto da minha vida sozinha, estaria bem agora — comenta Denton, que mora em Michigan, nos Estados Unidos. — Eu amo minha vida.
'Precisamos de muita paciência’
Namorar depois dos 60 não é um “mar de rosas”. Várias pessoas entrevistadas mencionaram como é frustrante conhecer pessoas cujos comportamentos tóxicos se calcificaram ao longo de décadas.
— Precisamos de muita paciência um com o outro para desfazer algumas dessas besteiras pelas quais passamos — comenta Kathy Denton, que conta que namorou homens que se revelaram mentirosos compulsivos ou que ela suspeitava terem problemas com álcool. A mulher diz ainda que interagiu com homens que claramente não se preocuparam em ler seu perfil e com outros que enviaram fotos nuas. Alguns pretendentes também mencionaram a disfunção sexual, o número cada vez menor de encontros para mulheres mais velhas e a ameaça de serem enganados.
Para a Sra. Ha e o Sr. Ecker, abrir-se um para o outro trouxe a ambos uma felicidade surpreendente nesta fase de suas vidas. Ecker estava namorando há 10 anos antes de conhecer a Sra. Ha, e estava saindo de uma fase particularmente difícil quando eles se conectaram. A sua mãe e o seu adorado cão tinham morrido, ele tinha terminado uma relação de três anos e tinha perdido uma parte das suas poupanças devido à volatilidade do mercado de ações, quando se preparava para se aposentar.
Agora, o casal “Ecker-Ha” está planejando a próxima etapa de suas vidas juntos, pensando em como querem que seja a aposentadoria. Eles se sentem sortudos por terem se encontrado.
— Desde aquela primeira mensagem que ela me enviou — ele conta — Senti que isso foi guiado e está fora de nosso controle — conclui.
Fonte:https://oglobo.globo.com/saude/noticia/2023/11/10/namoro-apos-os-60-anos-e-real-nao-preciso-mais-contar-historias-que-nao-sejam-verdadeiras-sobre-mim.ghtml
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