ERIKA LUST: ENTREVISTAMOS A MULHER QUE FAZ DA PORNOGRAFIA UMA CAUSA FEMINISTA


A cientista política e diretora de cinema, Erika Lust, dona de uma das mais importantes produtoras de filmes pornôs femininos (Foto: Reprodução)

A cientista política e diretora de cinema, Erika Lust,
dona de uma das mais importantes produtoras de
filmes pornôs
femininos (Foto: Reprodução)

Erika Lust: entrevistamos a mulher que faz da pornografia uma causa feminista

A argentina Milena Hot se auto-intitula a melhor atriz pornô da América Latina

MARIANA SANCHES
19 OUT 2012 - 20H01 ATUALIZADO EM 06 FEV 2017 - 16H57

Foi-se o tempo em que filmes pornôs eram mais chocantes do que excitantes para as mulheres. Pelo menos se depender de algumas propostas novas, que pretendem revolucionar a indústria pornográfica. Agora, mulheres comuns já podem ser, elas mesmas, as estrelas de produções adultas. Essa é a proposta da argentina Milena Hot, que se auto-intitula a melhor atriz pornô da América Latina. Por algo em torno de R$3 mil, mulheres, homens ou casais podem transar com Milena enquanto o marido da atriz filma tudo. Depois da ação, geralmente em um motel nas cercanias de Buenos Aires, os atores amadores levam a única cópia do filme para casa.
Para quem preferir a tradicional posição de telespectadora, tampouco há do que reclamar. Já existem algumas produtoras trabalhando para fazer pornôs cujo público alvo é a mulher. Uma das mais interessantes é a Lust Filmes, criada pela cientista política e diretora de cinema sueca Erika Lust. Erika foi a grande vencedora do último Feminist Porn Awards, no fim do ano passado, com o longa Cabaret Desire. O filme tem 75 minutos de duração, conseguidos graças a um enredo bem construído, diferente dos pornôs convencionais. Nos trabalhos da Lust não há ejaculação no rosto nem cenas de sexo analMais do que um entretenimento picante, Erika Lust afirma que seu trabalho é uma peça feminina e feminista. Seus filmes têm uma mensagem política. A seguir, a íntegra da entrevista. 

Cenas do making-of do premiado Cabaret Desire (Foto: Reprodução)

Cenas do making-of do premiado Cabaret Desire (Foto: Reprodução)

Marie Claire – Você estudou ciência política na Universidade de Lund. Existe alguma relação entre o que você aprendeu na academia e seu trabalho atual?
Erika Lust - Total! É triste dizer, mas o sexo ainda é um assunto muito político: tanto quando falamos sobre as leis que regulam a produção e o consumo de pornografia, quanto na negociação dos assuntos públicos com a vida privada. Às vezes me sinto como um político quando eu estou representando uma pornografia alternativa, e espalhar uma mensagem feminina positiva da sexualidade, só porque eu estou mantendo uma imagem pública e tomando parte em um discurso social. Meu curso certamente me ensinou muito sobre a negociação, o pensamento crítico, e a relação entre governo e sociedade. Mas foi meu foco especial em feminismo que influenciou minha visão de mundo e, mais tarde, a direção que o meu cinema tomaria.
MC – Qual é a diferença entre filmes pornográficos feitos para mulheres e aqueles feitos para os homens?
EL - De um modo geral, eu altero as perspectivas dentro do filme, o que se traduz em uma experiência totalmente diferente. Nos meus filmes, o foco está na excitação feminina e no prazer – eu tento mostrar algo que vá excitar uma mulher. E já que a maioria das mulheres que eu conheço tem gostos sexuais dinâmicos e diversos, eu uso um monte de elementos atmosféricos, como os personagens e situações complexas, cinematografia, iluminação, boa música – para melhorar a fantasia. Em filmes pornográficos comerciais (e convencionais), essas áreas são completamente inexistentes, uma vez que o foco é o ato em si.
MC – Por que as mulheres devem assistir a filme pornô?
EL - Se ela tem vontade de expandir sua percepção e conhecimento sobre sexo, pornografia pode ser uma ótima ferramenta erótica. Muitas mulheres me dizem que a pornografia serve não só para atiçar sua curiosidade, mas também inspirá-las, especialmente quando estão assistindo com seus parceiros. Pode também ser libertador para algumas mulheres, dependendo de quão reprimida foi a sua sexualidade ao longo da vida. Há tantas mulheres que tiveram uma má experiência com a pornografia convencional e, em seguida, deletaram qualquer idéia de experiências com pornô por completo. Mas se elas podem encontrar algo de que gostem, então o papel do sexo na sua vida parece mudar drasticamente. Isso pode resultar em uma compreensão mais profunda das próprias fantasias sexuais e necessidades (e como realizá-las e satisfazer-se), o que enriquece a experiência e melhora a qualidade de vida!
MC – Você filma apenas com atores profissionais ou também com casais reais fazendo sexo?
EL - Todos os artistas em meus filmes são atores, mas em alguns casos, eles são também casais na vida real. Eu realmente gostaria de incluir casais uma vez que eles têm uma ligação profunda e estão ligados para além do processo de filmagem. Eu acho que essa diferença é realmente perceptível no produto final. A cena imediatamente tem o ar de autenticidade e se torna uma história de qualidade sobre duas pessoas que compartilham mais do que um único momento íntimo.
MC – Existe alguma coisa que não pode entrar nos seus filmes?
EL - Em um esforço para fazer filmes que são autênticos e contribuam para criar uma representação positiva da sexualidade das mulheres, eu procuro evitar imagens comuns em pornô convencional, como cenas em que o ator ejacula na boca, no rosto da atriz e sexo anal. Além disso, nunca haverá quaisquer atos violentos, não-consensuais ou desumanos em meus filmes, já que isto fere a minha causa e as pessoas envolvidas.
MC – E quanto às mulheres que gostam de sexo anal?
EL - Eu tenho evitado usar cenas de sexo anal, não só pelo fato de que mulheres não gostam (até porque, certamente, existem mulheres que apreciam) mas por ser algo obrigatório na indústria pornográfica convencional. Ao apelar para um público que quer algo diferente do que havia em pornografia até então, eu tento criar novas cenas e diferentes formas de sexualidade.
MC – E o que não pode faltar?
EL - É difícil dizer o que vai ter apelo para todos os meus telespectadores, já que cada pessoa tem suas próprias preferências e fantasias. Mas tenho recebido respostas muito positivas para as minhas histórias envolvendo desejo bissexual e naqueles cujas situações são muito espontâneas. Parece que muitas pessoas compartilham essas fantasias!
MC – Na sua opinião, que tipo de cena excita mais as mulheres?
EL - 
Não posso falar por todas as mulheres, mas, na minha opinião, algumas das peças mais eróticas, geralmente se referem à fantasias do dia-a-dia das pessoas – coisas que raramente aconteceriam, mas que também não são situações bizarras. Os tipos de pessoas, lugares, circunstâncias que a são quase cotidianos, que permitem à imaginação facilmente passar do mundano para o muito sexy. Cenas como: uma sessão de massagem se tornando sensual, reacender uma paixão antiga, finalmente dormir com aquele vizinho, uma dança sensual em pole dance de uma garota na sua frente no metrô são algumas das mais instigantes que fiz até agora. Mal posso esperar pelas próximas! 



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