ASSIM NA CAMA COMO NOS FILMES: REFLEXÕES SOBRE O CINEMA E A LITERATURA ERÓTICA DOS ANOS 80


Sexo, Mentiras e Vídeo (1989)

Assim na cama como nos filmes


O que aprendemos com o cinema e a literatura erótica dos anos 80 e o que os miúdos andam a ver. 
Há 30 anos li às escondidas, e corando em quase todas as páginas, o livro O Último Tango em Paris. Uma década antes, a 30 de abril de 1974, hordas de espetadores fizeram fila nos passeios da Avenida da Liberdade, em Lisboa, para entrar no cinema S. Jorge e assistir às libidinosas aventuras de um Marlon Brando entradote e de uma jovem Maria a pedir pecado.
Fenómeno semelhante aconteceria com o livro O Amante de Lady Chaterley, que muito fez pelo meu imaginário erótico (ainda hoje não sei se para o bem ou para o mal) e depois, num ambiente intelectual vários furos abaixo, alguma coisa aprendi também com o blockbuster Oficial e Cavalheiro ou o mais encorpado Noites Escaldantes. Isto para dizer que a minha geração, putos que andavam de fraldas no 25 de Abril e que sonhavam com ‘malandrices’ ao som de Serge Gainsbourg, descobriu muita coisa sobre sexo com livros, filmes e até programas de rádio de discos pedidos.
Os rapazes (bem mais do que as raparigas) caçaram outro tipo de informação na pornografia, na altura quase limitada a livros com nomes de mulheres vulgares: ‘Ginas’, ‘Tânias’ e afins. É que no cinema, os filmes pornográficos eram vedados a maiores de 18 anos e os videoclubes estavam longe de dominar os bairros (primeiro ainda vieram as geladarias e as croissanterias). Tudo muito diferente do que se passa hoje com a maioria dos jovens, aos quais basta carregar numa tecla do seu telemóvel para aceder a cardápios exaustivos de porno.
Diversos estudos mostram que os telemóveis banalizaram de tal forma o consumo deste conteúdo que a cabeça e a performance dos miúdos está a mudar – e parece que não é para melhor. Revistas como a GQ ou a New York Magazine publicaram extensos artigos sobre o assunto e questionaram: “Será que a pornografia está a arruinar a nossa vida?” Razões não faltam para o temer. Os jovens adotam modelos de comportamentos desligados da realidade: sexo puro e duro, sem preliminares nem afeto, com vários parceiros ao mesmo tempo e performances irreais – ereções longuíssimas, por exemplo. Como esses filmes são feitos por homens e para homens (embora haja muita mulher a consumir), o papel feminino é sempre subalterno e padronizado: todas as raparigas adoram sexo oral e têm orgasmos sincronizados com o parceiro. Ou não têm. O que importa é que ele mostre bem os seus à câmara.
Cindy Gallop falou no assunto numa das mais populares conferências de TED (TED Talk): Make Love, not Porn. Citando o seu exemplo como o de alguém que “gosta de dormir com homens mais novos”, a consultora publicitária de 51 anos, que acabou por criar um movimento e um site com o título que deu à sua palestra, disse que o pior mal dessa predileção é tropeçar com frequência em parceiros que não estão preocupados em dar-lhe prazer. Só pensam em si próprios e nas acrobacias que veem no ecrã. E quando as coisas não correm como no PornoTube, viram as costas e vão procurar solução noutro filme, literalmente. Um estudo da Redditors, uma das empresas de conteúdos online mais famosas do mundo, revelou que o consumo de pornografia online começa cada vez mais cedo. Tornou-se um hábito entre miúdos dos 12 aos 14 anos (foi o que afirmaram 53% dos inquiridos) e um ato comum entre crianças com menos de 12 anos (16%). Não admira que Gallop afirme sem reservas: “Há uma nova geração que está a crescer com uma ideia completamente errada sobre o sexo.”
Por outro lado, o peso da literatura e do cinema na formação sexual parecem cada vez menores. Para quê ir às Amoreiras ver as loucuras de Lars von Trier em Ninfomaníaca, se há striptease na televisão ao sábado à noite em pacote familiar? É certo que 50 Sombras de Grey incendiou uns milhões de leitoras durante o verão de 2012, mas talvez neste caso seja abusivo falar de literatura… Falemos antes de cinema e dos filmes que marcaram a geração dos cravos, dos cardos e das rosas. 
As taras de Bertolucci
O Último Tango em Paris (1972) começou a ser rodado na cabeça de Bernardo Bertolucci muitos anos antes. Consta que o filme é uma reprodução das suas fantasias sexuais: o realizador sonhou várias vezes que encontrava uma bela mulher na rua e tinha sexo com ela mesmo sem saber o seu nome.
 - Maria Schneider, a protagonista do filme (que morreu em 2011), contou que a famosa cena da manteiga (que envolve sexo anal) não fazia parte do argumento. A ideia surgiu durante a rodagem do filme, em conversas entre o realizador e o protagonista, Marlon Brando. As lágrimas da atriz no filme são reais por ter sido informada da cena no momento em que a filmou e por se ter sentido extremamente humilhada com ela. Parece que só voltou a falar com Bertolucci pouco antes de morrer.


- Durante cinco anos, Bertolucci não pôde votar por causa do filme. O realizador, os dois atores e o produtor, Alberto Grimaldi, foram acusados pelo tribunal de Bolonha (quando o filme estreou em Itália) de terem feito um filme pornográfico. Acabaram por ser todos ilibados.
- O filme abre com uma imagem de dois quadros do pintor Francis Bacon. O realizador utilizou-os para apurar as cores que pretendia ver retratadas no seu filme.
Noites Escaldantes (1981)

Transformou Katleen Turner num  e deu um Globo de Ouro e um BAFTA a Laurence Kasdan, que filmou magistralmente a história de uma mulher falsa e ambiciosa que leva o amante a assassinar o marido, incriminando-o pelo sucedido e fugindo sozinha com a herança. É célebre a cena em que William Hurt parte o vidro da janela da sala de estar para se lançar sobre a suposta ‘presa’, e na realidade uma predadora sem escrúpulos, depois de a seguir até casa.
Bolero (1984) 

Estreou em 1984, ano em que foi  posto à venda o primeiro computador Macintosh da Apple, e foi realizado por John Derek, que aproveitou a forma física da mulher, a Bo, para ganhar uns cobres e pôr adolescentes e homens de meia-idade a olhar com lascívia para a vida equestre. Para muitos, o filme podia ser reduzido à cena em que a protagonista, uma jovem rica (e virgem) que corre mundo à procura do príncipe encantado, cavalga nua, na praia, com os cabelos ao vento (e as maminhas também).
Atração Fatal (1987)

Quando os homens casados caem nas garras de taradas libidinosas tudo pode acontecer. Que o diga o pobre Dan Gallagher, um advogado de respeito interpretado por Michael Douglas, que se envolve com a executiva psicopata Alex Forrest, desempenhada pela incrível Glenn Close (tão incrível que nunca mais a descolei deste papel e ainda hoje a detesto), enquanto a mulher está fora. Típica história da amante que não aceita o fim do affair e que está disposta a tudo para repetir a cena de sexo em cima do lava-louça
Sexo, Mentiras e Vídeo

(1989) Um advogado ambicioso, uma esposa frígida, uma irmã(dela)/cunhada(dele) atiradiça e um freak que chega à vida dos outros para lhes desarrumar o sótão. Basicamente, é esta a história de Sexo, Mentiras e Vídeo, filme que apresenta Steven Soderbergh (realizador) e Andie MacDowell (atriz) ao grande público. Uma narrativa curiosa sobre a frustração interior, a ruína dos papéis sociais e o sexo colateral.

O Último Tango em Paris (1972)


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