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Com “Mulher Maravilha” e Sofia Coppola, o cinema finalmente dá um passo para a igualdade de gênero
Recorde de bilheteria na semana de estreia e Palma de Ouro histórica em Cannes marcam o primeiro semestre da indústria, mas ainda há muito o que fazer
08/062017| POR PAULA JACOB | FOTOS DIVULGAÇÃO/REPRODUÇÃO
Para quem acompanhou a intensa semana do Festival de Cannes, que este ano mais pareceu um fashion week disfarçado de tapete vermelho, pode contemplar um dos momentos mais históricos da premiação. Sofia Coppola se tornou a segunda mulher a vencer a Palma de Ouro de Melhor Direção, por seu trabalho em O Estranho que Nós Amávamos, uma releitura feminista de uma obra de 1971. Duas semanas após o feito, estreava nos cinemas globais um dos filmes mais aguardados de 2017, Mulher Maravilha, dirigido por Patty Jenkins. A bilheteria chegou a números impressionantes e bateu o recorde de arrecadação na semana de estreia de um filme dirigido por uma mulher, com mais de US$ 100 milhões (aproximadamente, R$ 329 milhões).
A pergunta que fica é: por que estamos vibrando tanto com tais reconhecimentos? A resposta é simples, com nome e sobrenome. Desigualdade de gênero. A luta pelos direitos iguais entre homens e mulheres não é de hoje e também não se resume a uma área específica. Contudo, após o discurso emblemático de Patricia Arquette durante a cerimônia do Oscar de 2015, os olhares se voltaram para imensa discrepância da participação feminina nos filmes e reconhecimento igualitário entre os sexos nas diversas áreas de atuação em produtos cinematográficos.
Sem contar a minoria feminina negra, com Viola Davis como a principal ativista do movimento para igualdade de representatividade nas telas. A atriz foi a única negra a vencer um Oscar, um Emmy e um Tony. Além dela, apenas Jennifer Hudson, Mo'Nique, Octavia Spencer, Lupita Nyong'o, Halle Berry, Whoopi Goldberg e Hattie McDaniel, primeira negra a ser indicada em 1940, venceram nas categorias de atuação na premiação da Academia.
O Festival de Cannes não fica para trás como exemplo negativo. Antes de Coppola, apenas uma diretora mulher alcançou tal reconhecimento nos 70 anos de premiação, a russa Yuliya Solntseva, em 1961, por A Epopéia dos Anos de Fogo. O Oscar reconheceu apenas Kathryn Bigelow, única mulher a vencer por Melhor Direção em 89 anos de premiação. Na época, a mídia categorizou a diretora americana como ex-mulher de James Cameron, que disputava na mesma categoria por Avatar. Portanto, como as outras lutas de minoria na sociedade, o buraco é bem mais embaixo.
Porém, o cinema não se resume a atrizes e diretoras, jamais desmerecendo o trabalho de ninguém que fique claro. Existem excelentes diretoras de fotografia, como a argentina Natasha Braier (Demônio de Neon e The Rover - A Caçada), a francesa Caroline Champetier (Holy Motors e Homens e Deuses), a dinamarquesa Charlotte Bruus Christensen (A Garota no Trem, Um Limite Entre Nós e A Caça) e a francesa Agnès Godard (35 Doses de Rum e The Falling), entre tantas outras incríveis por trás das lentes. Contudo, a Direção de Fotografia é a única categoria do Oscar que nunca nem sequer nomeou uma mulher pelo seu trabalho.
Já para as diretoras de arte, a situação é melhor, mas demorou para ganhar espaço e reconhecimento. A categoria sofreu algumas mudanças durante a trajetória dos filmes, antes separadas por longas coloridos e em preto e branco, e muitas vezes confundida com set design (decoração de set). E mesmo assim, o sexo feminino era minoria no início da premiação e só ganhou reconhecimento depois dos anos 70. Anna Asp e Patrizia von Brandenstein foram algumas das primeiras a vencer a estatueta dourada. Catherine Martin, de Moulin Rouge (2002) e O Grande Gatsby (2014), e Luciana Arrighi, Howards Ends (1994), foram as únicas a vencer entre 1990 e 2017, pelos respectivos filmes apontados.
A diferença, portanto, não se restringe apenas nas categorias principais e se mostra muito pior nas vertentes mais técnicas, compreendidas como funções masculinas. Atitude que não se mostra nada coerente com a atualidade.
A verdadeira heroína
Pode parecer pouco, mas só o fato de Mulher Maravilha ser dirigido por uma mulher é algo impressionante. Isso porque os quadrinhos, em sua maioria, sempre trataram a figura feminina de forma fetichista e extremamente machista. Como se a super heroína fosse feita apenas para servir de par romântico para alguém ou um braço coadjuvante de uma figura masculina muito imponente e salvadora da pátria. Até o papel de Scarlett Johansson em Os Vingadores, franquia da Marvel, é extremamente sexualizado. Atrelaram, infelizmente, a postura heróica ao poder sensual feminino, com trajes justos e decotes extravagantes.
Pode parecer pouco, mas só o fato de Mulher Maravilha ser dirigido por uma mulher é algo impressionante. Isso porque os quadrinhos, em sua maioria, sempre trataram a figura feminina de forma fetichista e extremamente machista. Como se a super heroína fosse feita apenas para servir de par romântico para alguém ou um braço coadjuvante de uma figura masculina muito imponente e salvadora da pátria. Até o papel de Scarlett Johansson em Os Vingadores, franquia da Marvel, é extremamente sexualizado. Atrelaram, infelizmente, a postura heróica ao poder sensual feminino, com trajes justos e decotes extravagantes.
EEEem Mulher Maravilha, Patty Jenkins revive um ícone do inconsciente coletivo no primeiro filme digno de seu nome. Após versões frustradas e nada convincentes de Mulher Gato e Elektra, este é o primeiro filme em uma década sobre uma única personagem feminina e ao mesmo tempo heroína da própria história. Enquanto os filmes de O Homem de Ferro, Homem Aranha, Hulk e Batman colecionam edições e atores.
Além desse feito, Patty é a única mulher em 20 anos que Hollywood confiou um budget extremamente alto. Só perceber quem dirigiu os últimos filmes de maior custo de produção e terá uma resposta nada promissora para as mulheres. Então, quem é a real mulher maravilha aqui? O girl power ultrapassa os níveis óbvios de protagonismo feminino no filme e dão uma perspectiva analítica da indústria, falha, sim, na igualdade de gênero.
Protagonismo feminino longe da sombra
Apesar da situação ser de desigualdade, cada vez mais as mulheres no cinema mostram para o que vieram. Sofia Coppola poderia muito bem se atrelar ao sobrenome do pai, Francis Ford Coppola, para se beneficiar de alguma forma. Contudo, desde o primeiro filme seguiu a sua carreira, com identidade visual e roteiro próprios.
Kathryn Bigelow não precisou provar nada para ninguém, muito menos para a mídia, que a taxava como ex-mulher de James Cameron. Como se fosse um cargo importante a ser falado. Não. Ela é cineasta, diretora de Guerra ao Terror ou qualquer outra qualidade que queira atrelar seu nome.
A criatividade e a legitimidade não depende de nada além da genuinidade de um trabalho autoral.
A criatividade e a legitimidade não depende de nada além da genuinidade de um trabalho autoral.
Repórter da Casa Vogue, Paula Jacob é cinéfila de carteirinha, gosta de Wim Wenders a Sofia Coppola, passando, inclusive, pelos clássicos da Disney. Jornalista interessada por arte traz em A Arte do Cinema um olhar diferente sobre os filmes, abordando principalmente a direção de fotografia, direção de arte e figurino. Prepare a pipoca!
Fonte:http://casavogue.globo.com/LazerCultura/noticia/2017/06/com-mulher-maravilha-e-sofia-coppola-o-cinema-finalmente-da-um-passo-para-igualdade-de-genero.html
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